Acho que esse é um assunto que entendo: passei uma boa parte da minha vida me odiando por tomar decisões e ter pensamentos que eu achava que não eram corretos ou que apenas não deveria tê-los. Odiei-me por odiai-me durante ainda mais tempo, como descobri que era possível. Mas se tem algo que eu aprendi ao longo desses longos anos a respeito do ódio, é que nós nascemos com uma quantidade de ódio e ela permanece dentro de nós até a hora de nossa morte. Alguns têm a felicidade de nascer com menos, outros nem tanto. Gosto de pensar que nasci com pouco, com ele todo voltado para mim.
O grande segredo do ódio é não deixá-lo na sua forma mais pura e corrosiva, é transformá-lo em algo. Por que o ódio nunca nos deixa realmente, o que acontece é que aprendemos a lidar com ele. Nós paramos de rejeitá-lo como uma parte adjacente de nós e o deixamos permanecer em paz dentro de nós e então a luta finalmente se acalma. Há várias maneiras de domar essa fera de pele nem tão macia assim, desde comendo compulsivamente até fazendo escultura de argila, mas a forma mais bonita de controlar e cuidar da fera é amando-a. Nada é mais transformador do que o amor.
Encaremos o ódio como uma criança birrenta e mal-educada: nesse caso, sabemos que a criança provavelmente tem algum problema em casa e que na escolinha, quando ela age assim, é puramente desejo de atenção. Com o ódio é igual: ele só se manifesta por que precisa de atenção. Uma vez que o aceitamos e passamos a ignorar seus estímulos do mal, ele se metamorfoma em seu oposto: o amor.
E assim como o ódio, o amor é vivo, intenso e capaz de nos transformar. O universo é uma gostosa mistura desses dois elementos míticos humanos. Míticos por que não somos capazes de vê-los, apenas senti-los; Humanos por que sentimo-os dentro de nós, dentro de nossa natureza mais primitiva.
E tudo acontece quando passamos a enxergar o amor onde antes havia ódio. Quando antes alimentávamos tal fogueira com lenhas de ódio e substituímos por amor, é uma troca simples e racional: é entender que embora não vejamos sempre determinadas pessoas, quando as vemos ela parecem genuinamente felizes em estar conosco; é quando vemos pessoas querendo se aproximar de nós apenas por que nós somos e não por que temos nada a oferecer a elas; é entender que não seremos amados pelo número de pessoas que nos cumprimenta quando chegamos em um recinto e sim, pelo número de pessoas que se despedem quando saímos; é ver o amor nos olhos das pessoas que se aproximaram e que quiseram cuidar de nós quando nem nós mesmos estávamos dispostos a tanto; é ver o carinho quando se é lembrado mesmo quando já havia sido esquecido; é receber carinho de pessoas que não têm essa obrigação conosco, mas que mesmo assim fazem questão de dá-lo; o verdadeiro amor é ser capaz de encarar o ódio como um velho amigo, convidando-o para entrar e dividir uma xícara de chá.